Publicada em 14/10/2022 às 08h50 (atualizada há 14/10/2022 - 08:52)
Por unanimidade, a Quarta Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região julgou que o deslocamento de garis nos estribos dos caminhões é uma forma de transporte irregular, que coloca em risco os trabalhadores. Assim, determinou que a empresa que realiza a coleta de lixo em Limoeiro (PE) adeque a rotina de trabalho de modo a cessar com este modelo locomoção. O prazo é de 180 dias a contar do trânsito em julgado do processo.
Foi o Ministério Público do Trabalho em Pernambuco que ingressou com uma ação civil pública contra o município de Limoeiro e contra a empresa contratada para o serviço de coleta de lixo da cidade. Dentre outras coisas, requereu-se que os garis deixassem de usar a parte externa do caminhão para se locomover durante a coleta; também se pediu que a empresa ficasse responsável por fazer a higienização dos uniformes e equipamentos de proteção individual (EPIs), bem como fizesse o treinamento sobre a correta utilização; que houvesse o fornecimento de água potável durante a jornada de trabalho e mantivesse programa de vacinação. Pediu-se, ainda, que fosse estabelecida multa em caso de descumprimento e pagamento de dano moral coletivo. A maior parte desses pedidos foi julgada procedente na sentença e tanto a empresa quanto o MPT-PE entraram com recurso.
A empresa defendeu que o transporte nos estribos é um formato usado em todo o Brasil e em outros locais do mundo; que seria inviável que os garis ficassem descendo e subindo da cabine do caminhão a cada parada; argumentou não haver provas de que o modelo aumentaria o risco de acidente e, ainda, que a mudança na forma como o trabalho é feito exigiria grandes investimentos, causando um desequilíbrio econômico em relação ao contrato firmado com a Prefeitura de Limoeiro, o que terminaria desencadeando a rescisão contratual e, por consequência, a falta de coleta de lixo na cidade, algo que traria grandes transtornos à população.
A desembargadora Ana Cláudia Petruccelli, que integra a Quarta Turma do TRT-6, fez a relatoria do acórdão e discordou dos argumentos da empresa. Ela enumerou trabalhos científicos, notícias e processos judiciais que falavam dos riscos desse tipo de deslocamento. Os casos envolviam trabalhadores mortos, atropelados, que sofreram quedas, tiveram esmagamentos com o maquinário compactador de lixo, desenvolveram problemas no ombro, em razão da força necessária para se segurar no caminhão, sofreram contaminações, etc.
Diante disso, a desembargadora falou que tais condições ferem a dignidade da pessoa humana e as normas de higiene, saúde e segurança no trabalho. E ressaltou que a sociedade deve avançar sempre na direção de um maior patamar civilizatório que, neste caso, seria a mudança nos procedimentos de trabalho. Destacou haver exemplos bem sucedidos, seguros e eficientes de coleta de lixo como nas cidades de Guarapuava e Cascavel – ambas no Paraná – e em Jundiaí, em São Paulo. E ressaltou que o contrato com a Prefeitura possui cláusula sobre a possibilidade de reajuste para a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro. Portanto, manteve a obrigação de cessar esse tipo de transporte e multa de R$ 50 mil em caso de descumprimento.
Em relação à higienização de fardas e EPIs, a relatora salientou que a regra geral é que isto seja de responsabilidade do próprio empregado, porém a exposição frequente ao lixo traz mais riscos de contaminação biológica, de modo que os itens usados pelos empregados precisam de uma desinfecção mais eficiente que a lavagem comum em casa. Assim, ficou mantida a obrigação de a empresa fazer essa limpeza. Neste mesmo sentido, também ficou mantida a obrigação patronal de implantar programa de vacinação para os garis, visto que, em razão do trabalho, eles estão mais expostos a doenças preveníveis com vacina, como tétano e difteria. Ainda que a empresa já tenha adequado algumas dessas medidas, a desembargadora acatou o recurso do MPT-PE e arbitrou multa caso as situações irregulares voltem a acontecer.
Por fim, manteve a pena de R$ 100 mil a título de danos morais coletivos, devido à gravidade das infrações cometidas pela empresa e os prejuízos à categoria profissional e à sociedade. O valor é direcionado ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). O município de Limoeiro foi responsabilizado subsidiariamente pelas condenações relacionadas a pagamento.
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As decisões de primeira e segunda instância seguem o princípio do duplo grau de jurisdição, sendo passíveis de recurso conforme o previsto na legislação processual. Essa matéria tem natureza informativa, não sendo capaz de produzir repercussões jurídicas. Permitida reprodução mediante citação da fonte.
Texto e imagem: Helen Moreira