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Quem cuida da mente cuida da vida!

Quem cuida da mente cuida da vida! Com essa frase nasce o movimento Janeiro Branco, inspirado nas Campanhas Abril Verde, Setembro Amarelo, Outubro Rosa, Novembro Azul – movimentos de conscientização social. Idealizado pelo psicólogo Leonardo Abraão, essa corrente do bem inspira a valorização da saúde mental nas áreas de atuação da Psicologia. Com ações simples, vem sendo divulgada principalmente nas redes sociais, em todo o Brasil. A proposta é orientar a população sobre a importância de cuidar da mente da mesma forma que se investe em qualquer outra área da saúde.

É romper o véu da ignorância e do preconceito sobre os sintomas comportamentais, as doenças mentais, a desorganização psíquica e as consequências diversas que inclui o suicídio. O objetivo é desconstruir a história e a crença sobre a loucura, a banalização do sofrimento psíquico e não discriminar pessoas adoecidas, excluindo-as socialmente. É compreender que não há sofrimento isolado; o impacto é coletivo e sugere investimentos em políticas públicas de promoção de saúde mental. Culturalmente, o final do ano é sempre época de repensar planos e sonhos, de se comprometer com projetos de vida e buscar a felicidade. A campanha Janeiro Branco propõe investir na saúde mental a partir desse marco temporal, planejar e assumir compromissos com a feliz mente durante todo o ano.

A cor branca, por ser a junção de todas as outras, simboliza a possibilidade de pintar a vida com as cores que se quer ou necessita. Estimula investir na harmonia de todas as esferas: conjugal, familiar, filial, sentimental, espiritual, sexual, financeira e, principalmente, consigo mesmo e no social. Por outro lado, não é possível o equilíbrio psíquico sem pintar no branco a cor que simboliza o trabalho. Com Zé Dantas, o pai Gonzagão ensina: “Mas doutor uma esmola a um homem que é são ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão”. E ratifica o filho Gonzaguinha: “Sem o seu trabalho, o homem não tem honra. E sem a sua honra, se mata, se morre... não dá pra ser feliz”.

É inegável o rebatimento do atual cenário político e socioeconômico brasileiro na relação trabalhador-trabalho. Estudos confirmam o aumento do absenteísmo por doenças mentais, acidentes de trabalho e desemprego, de um lado; e, de outro, empresas falidas, sucateadas e sem a mínima condição de cumprir obrigações trabalhistas e legais. Entre esses polos, há fatores danosos advindos das relações socioprofissionais e principalmente dos modos de gestão inadequados, com práticas abusivas de violência, que configuram preconceito, discriminação, perda de chance, assédio moral, assédio moral passivo ou sexual, gestão por injúria, dentre outras. Identificar com certeza esse dano e o nexo de causalidade requer conhecimento específico e aprofundado sobre o tripé: cultura e clima organizacional, redes de poder nas organizações e aspectos individuais e grupais dos sujeitos.

É preciso considerar, desde a estrutura e a psicodinâmica da personalidade, a história de vida, as condições de desenvolvimento, dentre outros fatores subjetivos individuais e grupais, até aspectos de significado e significância do trabalho para cada trabalhador. Os contextos até podem ser os mesmos, mas cada indivíduo utiliza estratégias de defesa distintas para suportar e superar o sofrimento ou mesmo o adoecimento mental em decorrência do trabalho. O Janeiro Branco precisa de promotores também na esfera da saúde mental dos trabalhadores. Alguns indicadores como a análise de dados estatísticos, a exemplo dos Anuários do INSS, assim como as pesquisas científicas que permitam prevenir, recuperar e promover a saúde mental, podem subsidiar propostas de ambientes laborais psiquicamente saudáveis.

Assim, pode-se falar da contribuição da Psicologia do Trabalho sob dois aspectos. O primeiro se refere às repercussões do cenário atual do trabalho na saúde mental do trabalhador magistrado da Justiça do Trabalho. O segundo, ao suporte pericial através da avaliação psicológica frente às alegações de adoecimento psíquico de trabalhadores e o nexo de causalidade laboral, os fenômenos da cultura organizacional e das redes de poder que podem favorecer a desorganização do trabalho e suas consequências danosas na saúde mental dos trabalhadores. No cenário descrito, cresce o número de lides trabalhistas e, portanto, a demanda por prazo e por produtividade dos magistrados e, em paralelo, o aumento crescente de processos a serem julgados e sentenciados, não pode ser tratado como uma produção em massa ou a prestação de um serviço mais ou menos estruturado.

Cada julgamento é único! Cada sentença é única! E qualquer tentativa de massificar ou mesmo informatizar as atribuições dos magistrados, como já se discute, incorre fatalmente no erro crasso de condenar perenemente um dos lados. Portanto, cresce a demanda de trabalho e com ela a responsabilidade ética do julgador. Afinal, com os avanços tecnológicos e os fatos inéditos que acontecem no contexto laboral, exige-se desse “trabalhador” atualizar-se continuamente e conhecer com maior profundidade os aspectos relativos ao mundo do trabalho. A cada dia aumentam a complexidade e o ineditismo de situações que exigem do julgador novos conhecimentos para tomar decisões sobre a vida de outros obreiros, que não encontram outro lugar que possa garantir seus direitos e seu desejo de justiça.

Os rebatimentos das mudanças e complexidades nas atividades dos magistrados demandam ações psicossociais de suporte e cuidado como condição sine qua non de promoção de saúde mental dos magistrados – profissionais que julgam e garantem os direitos de trabalhadores e empregadores. Assim como é primordial cuidar dos cuidadores e, nesse caso, os profissionais de Psicologia, também é necessário promover a escuta e o suporte clínico, a partir da Psicologia Clínica do Trabalho, promovendo o diagnóstico das condições de trabalho que possam repercutir em sofrimento ou até adoecimento psíquico dos juízes do Trabalho e, a partir das oportunidades de melhoria identificadas, propor estratégias de intervenções psicossociais.

A Psicologia Clínica do Trabalho também contribui como suporte pericial através da avaliação psicológica que subsidia a tomada de decisão dos magistrados diante de um conjunto de conhecimentos científicos que extrapolam suas competências. O aumento de lides trabalhistas contendo queixas de danos psicossociais laborais, bem como o crescente número de benefícios pagos pelo INSS para trabalhadores acometidos de doenças mentais cujo nexo de causalidade está relacionado ao trabalho, exigem profissionais que agreguem com mesmo grau de expertise o diagnóstico organizacional e o diagnóstico clínico mental e psicossocial do trabalhador.

O Janeiro Branco é um compromisso coletivo. Cada um precisa fazer sua parte! Ao acolher reclamantes em sofrimento psíquico, é possível cuidar de sua saúde, prevenir sua morte em vida e até uma vida retirada pela morte da esperança, quando o magistrado toma decisões embasadas na ética e promove justiça.

Texto: Andrea Keust Bandeira de Melo (juíza do Trabalho da 8ª Vara do TRT-PE) e Laura Pedrosa Caldas (doutora em Psicologia Clínica no Trabalho e Coordenadora de pós-graduações em Psicologia da Faculdade Redentor/I.D.E Cursos)

Ilustração: Simone Freire